Diretriz - Aplicada

Escopo

Entre os requisitos para desenvolver um programa de intervenção em ABA estão a seleção dos comportamentos que serão trabalhados. Esse comportamento-alvo deve ser relevante para o indivíduo, o que depende de uma série de questões. A primeira delas é o reconhecimento de alguns comportamentos a que chamamos de “cúspides comportamentais”, que são comportamentos que permitem acesso a novas contingências e reforçadores, que nos levam a patamares superiores que nos permite aprender novas coisas, como a leitura, que nos permite acessar textos sobre quaisquer assuntos, discriminar ônibus, produtos, sinalizações, entre outros, ou seja, dando acesso a novas oportunidades de aprendizagem e de reforçamento. A mesma coisa se pode dizer da comunicação, da imitação, entre outros. Daí que a pesquisa sobre ferramentas informacionais para o ensino de pessoas com TEA deveria conhecer estes comportamentos que podem ser considerados cúspides.

Quando um indivíduo com autismo entra em um processo de intervenção baseada em ABA, uma avaliação inicial irá compreender o seu repertório comportamental, a fim de fundamentar um programa de intervenção individualizado para o mesmo. Para a escolha das habilidades que serão abordadas, consideram-se diversos aspectos pertinentes como:

O primeiro passo para realizar uma avaliação do desenvolvimento do(s) sujeito(s) alvo(s) que irá definir qua(is) habilidade(s), seus pré-requisitos e barreira(s) de aprendizagem que a tecnologia assistiva visa trabalhar durante o processo de intervenção é ter acesso a uma avaliação minuciosa, que pode ser feita por profissionais, como psicólogos ou analistas do comportamento, utilizando algum protocolo de rastreio como: Verbal Behavior Milestones Assessment and Placement Program (VB-MAPP) (PARTINGTON; SUND-BERG, 1998), Assessment of Basic Language and Learning Skills – Revised (ABLLS-R) (PARTINGTON; SUNDBERG, 1998; PARTINGTON, 2010), Assessment of Basic Learning Abilities (ABLA) (KERR et al., 1977), Essentials for Living (EFL) (MCGREEVY;FRY; CORNWALL, 2014), Assessment of Functional Living (AFLS) (PARTINGTON;MUELLER, 2012), etc.

O(s) pré-requisito(s) que o(s) sujeito(s) alvo precisa(m) saber ou tem que ser capaz de fazer antes de aprender uma determinada habilidade é importante de serem identificados também, assim exemplos destes pré-requisitos seriam:

Requisitos Tecnológicos

Seguindo essa diretriz, de acordo com Guha, Druin e Fails (2008) e os princípios do DCU e do DP, conhecer as características do(s) indivíduo(s) alvo da intervenção, o(s) comportamento(s) alvo(s) relevante(s), os pré-requisito(s) para tal(is) comportamento(s), e sua(s) respectiva(s) barreira(s) de aprendizagem é determinante para identificar e avaliar qual(is) seria(m) a(s) tecnologia(s) adequada(s) para interagir com o(s) sujeito(s) no processo de intervenção. Dessa forma, essa etapa é de suma importância, pois uma vez que se identifica adequadamente os stakeholders e suas principais características, a definição de quais seriam as melhores opções de tecnologias a serem adotadas se torna mais fundamentada. Além destas informações, levar em consideração no momento de projetar uma tecnologia assistiva as heurísticas propostas por (NIELSEN, 1994) e (SHNEIDERMAN et al., 2016) e os padrões de interação como os propostos por (WELIE; VEER; ELIËNS,2001; ARVOLA, 2006; BORCHERS, 2008) e (TIDWELL, 2010), tais abordagens contribuirão com as fases do ciclo de vida de desenvolvimento da tecnologia e usabilidade e qualidade do produto final.

Assim, como forma de contribuição nesta fase pode-se utilizar a elicitação de requisitos, que é a primeira atividade no processo de Engenharia de Requisitos, em que se busca entender quais são as características dos usuários que devem ser atendidas pela tecnologia que será desenvolvida (THAYER; DORFMAN, 2000).

Aplicações Tecnológicas

Esta seção objetiva apresentar exemplos de pesquisas que mostrem a relação tecnologia e comportamento alvo que necessita ser modificado por uma intervenção. As pesquisas descritas aqui não se restringem apenas a tecnologias assistivas desenvolvidas baseadas na ABA, pois o objetivo é mostrar de forma geral que elas podem ser utilizadas para auxiliar no tratamento de diferentes comportamentos, habilidades ou barreiras.

Tecnologia

Dispositivos móveis e web.

Descrição

O trabalho de Whalen et al. (2006) propôs o TeachTown, desenvolvido baseado no Discrete Trial Training (DTT) e no Pivotal Response Training (PRT), para ser utilizado por crianças em idade pré-escolar com foco em ensinar uma variedade de habilidades socialmente significativas como: linguagem receptiva, compreensão social, autoajuda, atenção, lembrar, processamento auditivo e habilidades acadêmicas iniciais (todos comportamentos cúspides). Este estudo incluiu quatro crianças com diagnóstico TEA, pontuação média de 38 na Childhood Autism Rating Scale (CARS) e idade média de 4 anos. Os resultados mostraram que todos os participantes obtiveram mudanças significativas nos comportamentos, melhorando a comunicação social e diminuindo comportamentos inadequados.

Descrição

O estudo de Crutchfield et al. (2015) teve como objetivo investigar a eficácia do auto monitoramento para diminuir comportamentos estereotipados de sujeitos com TEA, utilizando o aplicativo I-Connect. Este estudo envolveu dois alunos com 14 anos de idade que recebiam serviços de educação especial por causa do TEA e apresentavam comportamentos estereotipados. Os alunos apresentaram QIs na faixa de 53 a 54 pontos e habilidades adaptativas na faixa moderadamente deficiente (54 a 58 na escala Vineland Adaptive Behavior Scales, Second Edition – VABS-II). Os resultados indicaram que ambos os participantes demonstraram uma diminuição imediata no nível de estereotipia com o uso do I-Connect durante a intervenção, por outro lado, há uma indicação clara que na ausência do I-Connect teve um aumento constante no comportamento alvo ao longo do tempo.

Este caso é especialmente relevante porque o auto monitoramento é uma cúspide comportamental porque o indivíduo pode monitorar inúmeras instâncias de seu próprio comportamento e modifica-las conforme melhor lhe aprouver, mas também porque trata-se de um processo fundamental de empoderamento da própria pessoa com deficiência, que passa a ser mais capaz de modificar seus próprios comportamentos, sem depender necessariamente da decisão e observação de outrem, aproximando-se do ideal da autonomia que é sempre o objetivo fundamental da intervenção.

Tecnologia

Robôs

Descrição

A atenção de crianças é uma habilidade socialmente significativa e foi monitorada por meio de gravação de vídeo enquanto a criança interagia com um robô durante sessões de ABA. A pesquisa de Dickstein-Fischer et al. (2017) envolveu crianças de 5 a 8 anos de idade diagnosticadas com TEA, variando do nível de moderado a severo. As tarefas deste robô são implementadas utilizando o Ensino por Tentativas Discretas (Discrete Trial Teaching – DTT). Por meio de expressões faciais, movimento do corpo, dicas verbais, rastreamento baseado em visão o robô interage com uma criança. A avaliação qualitativa da orientação do olhar e da face da criança nos dados de vídeo gravados mostrou que as crianças ficaram mais envolvidas (atenção) durante as sessões que envolveu o robô, além disso, o tempo das sessões foram cerca de 50% mais curtos. A saber, comportamentos atencionais são cúspides, pois permitem acesso a novas aprendizagens impossíveis sem sua aprendizagem prévia.

Tecnologia

Software para Desktop

Descrição

O objetivo do trabalho de Cummings e Saunders (2019) foi fornecer aos profissionais informações de como utilizar o Microsoft Power Point 2016 para automatizar o processo de aplicação do Matching-to-sample (MTS), por exemplo, em intervenções que envolvem sujeitos com TEA. Em cada tentativa, o sistema projetado apresenta uma série de três imagens (um Estímulo Discriminativo e dois Estímulos Delta – isto é, distratores) e um áudio (estímulo modelo ou estímulo condicional). Se a criança tocar na imagem correta, um reforçador (áudio, vídeo, etc.) é apresentado pelo sistema. Caso a criança não acerte a imagem o sistema não apresenta nenhum reforço.

Tecnologia

Jogos

Descrição

Tendo como objetivo ensinar habilidades socialmente significativas de alfabetização para crianças com TEA em idade escolar, especificamente a leitura, (SERRET et al., 2017) desenvolveram um jogo sério chamado SEMA-TIC, que se baseia em habilidades cognitivas não verbais e usa estratégias de aprendizagem específicas adaptadas às características de indivíduos com autismo. Fizeram parte deste estudo 25 crianças com TEA, idade entre 6 a 11 anos, com limitações verbais (Childhood Autism Rating Scale-Translated (CARS-T) ≥ 3), e raciocínio lógico ≥ 15 (pontuação bruta) aferido pelo Raven’s Colored Progressive Matrices (RCPM). Os resultados da aplicação do SEMA-TIC indicaram uma usabilidade adequada, pois todos os participantes conseguiram jogar adequadamente e se engajar no treinamento (adaptabilidade); progredir na série e completar o treinamento (eficiência); e adquirir e melhorar algumas habilidades de alfabetização (eficácia). As habilidades de alfabetização melhoraram significativamente após o treinamento. Como já descrito, os comportamentos de ler e de escrever com compreensão abrem inúmeras possibilidades de novas aprendizagens e acesso a reforçadores.

Como Utilizar Esta Diretriz

Referências

Arvola, M. (2006). Interaction design patterns for computers in sociable use. International journal of computer applications in technology, 25(2-3), 128-139.

Borchers, J. O. (2008). A pattern approach to interaction design. In Cognition, Communication and Interaction (pp. 114-131). Springer, London.

Crutchfield, S. A., Mason, R. A., Chambers, A., Wills, H. P., & Mason, B. A. (2015). Use of a self-monitoring application to reduce stereotypic behavior in adolescents with autism: A preliminary investigation of I-Connect. Journal of Autism and Developmental Disorders, 45(5), 1146-1155.

Dickstein-Fischer, L. A., Pereira, R. H., Gandomi, K. Y., Fathima, A. T., & Fischer, G. S. (2017, March). Interactive tracking for robot-assisted autism therapy. In Proceedings of the Companion of the 2017 ACM/IEEE International Conference on Human-Robot Interaction (pp. 107-108).

Guha, M. L., Druin, A., & Fails, J. A. (2008, June). Designing with and for children with special needs: An inclusionary model. In Proceedings of the 7th international conference on Interaction design and children (pp. 61-64).

Kerr, N., Meyerson, L., Flora, J., Tharinger, D., Schallert, D., Casey, L., & Fehr, M. J. (1977). The measurement of motor, visual and auditory discrimination skills in mentally retarded children and adults and in young normal chilren. Rehabilitation Psychology, 24(3), 91.

McGreevy, P., Fry, T., & Cornwall, C. (2014). Essential for Living: A Communication, Behavior and Functional Skills Curriculum, Assessment and Professional Practitioner’s Handbook for Children and Adults with Moderate-to-severe Disabilities. Patrick McGreevy, Ph. D., PA.

Nielsen, J. (1994, April). Usability inspection methods. In Conference companion on Human factors in computing systems (pp. 413-414).

Partington, J. W., & Sundberg, M. L. (1998). The assessment of basic language and learning skills (the ABLLS): An assessment, curriculum guide, and skills tracking system for children with autism or other developmental disabilities: The ABLLS protocol. Behavior Analysts.

Partington, J. W. (2010). The Assessment of Basic Language and Learning Skills-Revised (the ABLLS®-R): An Assessment, Curriculum Guide, and Skills Tracking System for Children with Autism Or Other Developmental Disabilities. Behavior Analysts.

Partington, J. W., & Mueller, M. (2012). The assessment of functional living skills [AFLS]. Pleasant Hill, CA: Behavior Analysts, Inc.

Serret, S., Hun, S., Thümmler, S., Pierron, P., Santos, A., Bourgeois, J., & Askenazy, F. (2017). Teaching literacy skills to French minimally verbal school-aged children with autism spectrum disorders with the serious game SEMA-TIC: An exploratory study. Frontiers in psychology, 8, 1523.

Shneiderman, B., Plaisant, C., Cohen, M. S., Jacobs, S., Elmqvist, N., & Diakopoulos, N. (2016). Designing the user interface: strategies for effective human-computer interaction. Pearson.

Tidwell, J. (2010). Designing interfaces: Patterns for effective interaction design. ” O’Reilly Media, Inc.”.

Thayer, R. H., & Dorfman, M. (2000). Introduction to Tutorial: Software Requirements Engineering.

Van Welie, M., Van Der Veer, G. C., & Eliëns, A. (2001). Patterns as tools for user interface design. In Tools for Working with Guidelines (pp. 313-324). Springer, London.

Whalen, C., Liden, L., Ingersoll, B., Dallaire, E., & Liden, S. (2006). Behavioral improvements associated with computer-assisted instruction for children with developmental disabilities. The Journal of Speech and Language Pathology–Applied Behavior Analysis, 1(1), 11.

Diretriz Conceitual
Diretriz Comportamental